Sempre gostei de encarar minha vida como se fosse um livro, com direito a vários capítulos e obstáculos culminando em um final – o encerramento de uma etapa – para, logo em seguida, recomeçar em um novo volume. Me pego, até mesmo, descrevendo mentalmente momentos, criando diálogos e narrações, interpretando sensações e pequenos acontecimentos intercalados em primeira e terceira pessoa. Eu nunca disse ter uma mente normal… Mas viver uma história é muito diferente do que fazer sua leitura, e às vezes me pego pensando que gostaria de ser leitora da minha (sabe, ter um livro como aquele da Tamara, de O Livro do Amanhã?)
Após a leitura de Delírio, de Lauren Oliver, fiz um post com minhas reflexões e o chamei de Delírios Após “Delírio”. Tive uma boa resposta dos leitores e, alguns, me pediram para “delirar” mais vezes.
Quando leio, é comum solucionar enigmas e prever desfechos. Seria ótimo poder desvendar alguns mistérios na vida real, situações que, por mais que eu pense por horas e dias a fio, talvez nunca chegue a uma conclusão. Talvez eu até me aproxime das verdades, talvez as acerte em cheio. Porém, nem sempre há um conflito final, quando tudo é revelado, e assim o mistério permanece para sempre, até enfraquecer, perder sua importância, e dar lugar a um novo suspense. Mas, até que isso aconteça, fica ali, rondando os pensamentos e os consumindo, mostrando-se presente mesmo quando deveria estar quietinho em seu canto. É fácil, em uma leitura, prever os próximos passos, ainda que não exatamente sejam definidos quais. Se o livro está no começo, no meio ou no fim, automaticamente identificamos o que pode ou não acontecer e já começam as suposições. Mas na vida real, o mais frequente é que, quando esperamos, nada aconteça, e quando estamos despreparados, somos atingidos por uma avalanche de eventos. E, como a maior das ironias, me vejo desejando os odiados spoilers. Às vezes seria tão mais prático e tão menos dolorido saber o que vai acontecer, horas de ansiedade e infrutíferas expectativas poderiam ser evitadas com uma única resposta. Talvez a maior diferença entre a vida e os livros é que esses são escritos por somente um autor, poucos os que são criados em conjunto. Uma só pessoa para tomar as decisões de cada personagem, podendo modificar cada acontecimento em favor de sua própria vontade. Na vida real, somos autores e personagens e só atuamos em nossos próprios enredos, sem controle nas histórias além das nossas. A vida real é uma antologia. Na vida real, existe o livre-arbítrio. Provavelmente seja essa a graça em viver: essa imprevisibilidade. Talvez, o sentido de tudo esteja em aprender com cada decisão, como se cada situação fosse um novo teste. E, no fim, é isso o que me cabe: me contentar em ler os capítulos passados enquanto escrevo uma nova página por dia, para não correr o risco de deixar meu livro em branco por delirar demais sobre as cenas dos próximos capítulos…
Mi, adorei o texto. Concordo que seria bom pular as páginas e saber o que acontece, para então voltar ao momento mais tranquila.
Achei bonito dizer que somos autores e personagens, porque eu também às vezes me pego “romanceando” minha vida. Querendo descobrir respostas, comparando minhas vivências com a ficção, criando cenas na minha cabeça e seus diálogos.
Não sei se a graça de viver está na imprevisibilidade, porém é isso que temos. Cabe-nos aproveitar.
Beijos,
liliescreve.blogspot.com